20 de dezembro de 2018



O verão está aqui. Ciclicamente ele sempre retorna, mas dessa vez estou melhor. Observo meus seios fartos com espanto, como se quisesse conhecê-los. Olho minhas coxas dando voltas por aí, saltitantes. Os cabelos, mais curtos, tão leves, inteiramente únicos. Sempre desprezei essa estação, porque nunca estava boa o suficiente para ela. É construção antiga, um pouco mais de trinta anos. O verão está em minhas pernas e braços. Eles dançam, deliram e correm. Eles nadam. Tomam sol. Jogam bola. Meu corpo é sagrado. O verão sou eu.
Querido, declare-se. 
Só amor pode salvar essa gente.

16 de dezembro de 2018

Universo (mágico) paralelo



Nos preparamos com antecedência: 
Roupa, pão, transporte, economias, flores, paz. 
Tecemos amores, rezas, 
Construímos a tela mental primorosamente. 
A roupa rasgou, tamanho o corpo que não cabia em si, 
A hora apertou contra a parede, tantos imprevistos! 
Mas triunfamos. 
Lembro do salão em festa, 
Enfeitado de amigos. 
Do calor, 
Abrindo espaço em cada abraço. 
A energia caiu pra mostrar que cantamos à capela, se for o caso! 
Cada festival é assim, único. 
Mãos dadas nas mãos dadas até formar um círculo e abraçar a Terra. 
Ficou a lembrança. 
O resto, é dança.

14 de dezembro de 2018

Elo

Depois de provar o etéreo,
Tudo quer conversar comigo. 
Forças me pegam pelo braço e sinalizam 
Em poemas, ou canções, 
Em sonhos, ou pessoas. 
O mistério me abraça. 
Eu, comovida, abraço de volta.

13 de dezembro de 2018

Bem-me-quero

Foi no álbum de figurinhas 
Onde aprendi poesia. 
Não com os versos, simples, rimados, 
Mas com as vidas contidas em cada cena. 
Deixei as mulheres falarem, 
Era minha voz. 
Foi assim.

11 de dezembro de 2018

Sobre Nando e Cássia

Não uso all star azul 
Nem preto de cano alto 
Meus amigos foram partindo de mim 
E eu deles 
Porque vivo num vazio inconsolável. 
Meu coração é cercado por crocodilos selvagens.

2 de dezembro de 2018

Crítica sobre método avaliativo ou tratado sobre liberdade.

Ambiente gelado.
Janelas pintadas de maneira que não se veja o exterior.
Carteiras enfileiradas.
Paredes lisas, cores sóbrias.
Pessoas com rostos comuns.
Uma garota pede: Alguém tem caneta preta?
Silêncio.
Ninguém preparado para ruído.
A fiscal pega meu dedo e passa numa tinta escura, fico observando minha impressão digital no papel. 
Meu dedo e o dela, um instante apenas,
O único contato humano até o momento.
Cinquenta questões objetivas, múltipla escolha.
Escuto distante um pássaro do lado de fora. 
Esqueço da pergunta que acabara de ler.
Silêncio.
Nem tudo está perdido, tem uma crônica do Moacyr Scliar e uma tirinha genial do André Dahmer. 
Humor ácido em ambas.
Há quanto tempo estou aqui?
Envelheço.
Passo por matemática, com alguns ferimentos,
Derrapo nos pensadores, tantas teorias sobre a educação que nunca usei, eu penso.
Ainda tem a redação.
Rascunho muitas coisas, apago.
Tese, antítese, será que meu texto ficou esquerdopata demais?
Apago.
Melhor aparentar neutralidade, concluo.
Não consigo.
Foda-se.
Passo a limpo.
Foram três longas horas.
Será que está claro ainda?
O corpo dói.
Tem as questões de chutar. Ô saco, deveria ter chutado antes.
Vontade de urinar. 
Tem muita gente na fila.
Já está quase na hora, o som exterior distrai minha cabeça.
Entrego a prova com urgência, preciso sair. Rápido.
Você prestou para quê?
Para trabalhar com crianças, acredita?
Sigo dois, três, dez quarteirões sem rumo. 
Finalmente livre.

Convite

Cara colega, 
Essa carta é para lhe dizer sobre ele. 
Como em tão pouco tempo 
Foi certeiro o golpe na autoestima 
Devido a uma canalhice sem precedentes. 
Aprendi como é ser tratada como objeto apenas 
Num relacionamento doente. 
Escrevi tratados sobre inveja, ciúmes, violência 
Para ninguém passar por isso 
Nunca mais. 
Então vi que a nova vítima é você 
E gostaria de alertá-la. 
Também não sei se me ouviria 
Porque fomos condicionadas a ser inimigas. 
- Inimigos não dividem informações privilegiadas. 
Gostaria que fosse diferente dessa vez 
O mal perdendo forças, 
A gente ganhando liberdade. 
Estou aqui se precisar 
Vamos conversar?